quinta-feira, 30 de junho de 2011

De nó em nó

Cala-se a dor num abraço que se parte, sem chegar a acabar.
As violetas murchas acabam-se ali, sem nenhum pasmo ou angústia.
Suspiro inquieto e carregado de pó, o que sobra de uma espera gasta.
Os passos estão pesados como um coração empedernido.
Não se aguenta nem mais um olhar torto, ainda que seja do mais sóbrio.
O corpo é agora silêncio, um lugar negligentemente despovoado.
Por uma alma cansada que se retira sem olhar para trás.
Finge-se sentir o sol, finge-se um querer a transbordar de alento.
Duvida-se da glória eterna, mas recomeça-se…
De ponte em ponte, em passos lentos e seguros de insensibilidade.
A morte tem o dom de nos esvaziar de sentidos e batimentos.
Já não há perigos para quem se torna impiedoso com as ameaças.
Subsiste a memória como, única, sombra corrosiva.
O fim que se aguarda e ninguém sabe, mesmo quem já o escreveu.
Devagar…
Assim de nó em nó, laço a laço se vive e se reinventa um novo destino.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Tenho vontade..

Tenho um sonho descorado.
Esfolado, roto, irremediavelmente desconcertado.
Tenho fome de lucidez.
Constante sem ser permanente.
Que sobrem momentos de alucinação e desvario.
Tenho urgência de desapego.
Que se desgarrem de mim as esperanças.
Que se calem essas vozes sábias e certeiras.
Ninguém pediu conselhos insossos.
Quero mandar as estrelas às favas.
E encomendar a morte da noite que não chega.
Tenho sede de escuro e de treva.
A luz é traiçoeira para quem se revela.
Quero ser impermeável aos mares de dor.
Atiro o coração pela janela e desejo que se parta.
Ou que os raios o partam que eu já não o suporto.
Não quero que volte, não quero que bata à porta.
Que vá encontrar o seu rumo e me deixe em paz.
Tenho desejo dessa pasmaceira que a tantos faz feliz.
Ou sei lá, cortar o destino aos pedaços.
E juntá-los conforme as minhas ganas.
Tenho vontade de lançar sortilégios à própria sorte.
Chego a temer ser-me uma lástima.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Conta-me um segredo!

Peço-te que me contes um segredo,
E tu falas-me de amor.
Desisto…
Como te posso dar ouvidos,
Se enclausuras o maior de todos os sentimentos.


Ah… calma!
É um engano por certo,
Falas-me de qualquer outra coisa.
Pois que do amor sei pouco,
Mas conheço a sua maior arte.
Sei que o amor…
Não se consegue ocultar ou dissimular.


Uns dizem que é ferida aberta,
Que dói e não se cura.
Alguns dizem que é uma força,
Que nos alimenta e nos segura.
Outros há que dizem coisas que
Não percebo ou não me desperta.


Vá, conta-me um segredo…
Não fales do amor,
Se o sentires é já bastante!
E deixa-me que te diga,
Amor,
Não sabes do que falas!

Sentir sem Saudade

Não importa o que fizemos com aquele dia.
Se tu mataste a eternidade com a falta de vontade.
Eu maltratei a calma com mágoas que não eram tuas.
Não importa que estejamos sujos e rotos como um trapo.
Em mim tudo foi vivo e isso é já tanto.
Tenho nas mãos todos os sentimentos que agarrei.
Deixei que as palavras se fossem com as contrições pesadas.
Ninguém precisa delas, que só cansam o sentir.
Deixei que escorressem por mim com todos os enganos e fraquezas.
Lavadas num mar de solenidade e paz.
Como uma chuva que purifica as almas desavindas.
De nada serve o orgulho fechado na gaveta da vingança.
Porque a desilusão é natural em quem sonha.
E nós sempre fomos selvagens com a imaginação.
Nada há para perdoar ou esquecer.
Não há nostalgias acesas.
Há somente desejos lassos guardados num tesouro antigo.
Sem nenhuma pressa, remexo as lembranças.
Rasga-se no rosto um largo sorriso.
Entro num tempo ido com a música perfeita.
Dançamos naquele jeito pausado e concertado, tão distinto e nosso.
Tu falas-me ao ouvido, eu faço "shiuu" como sempre.
É como se sentisse…
É como se estivéssemos lá, naquele momento que não volta.
O que importa que jamais pertençamos à mesma cena?
Assim me perco num momento em que se enlevam as memórias.
Sabe bem, sabe a vida e a verdade.
Sabe a sentir sem réstia de saudade.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Tormenta

Há uma duna de névoas e de memórias turvas.
Tantas tristezas sopra, agora, o vento.
E levantam-se todas as mágoas, no tempo enterradas.
Mancha-se o pensamento com nódoas antigas.
Perfilham-se os esconjurados arrepios antes desamparados.
A alma tinge-se de negro amargurado e arranhado.
Esfola-se a razão à força de ignorar, de esquecer.
Vêm fantasmas favorecidos por uma imaginação entusiasmada.
Mas há falta de coragem e há um intenso medo.
Uma febre violenta, um cansaço pouco audaz.
A consciência expressa-se num modo imperceptível ao corpo.
Infiel, demasiado infiel.
Nenhum calor, nenhuma ordem, só uma perturbação impiedosa.
Os olhos fecham-se numa emboscada a um sono esforçado.
E este silêncio que condena o delírio à sua merecida clausura.
Tudo se apaga enfim…

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Amor, a minha vaidade!

Ponho no papel o que o coração me põe na mente.
Indiscreto, talvez.
Imprudente, tanta vez.
Tenho uma alma que grita num corpo ansioso.
Ninguém disse que era pacífico.
Não há calma.
Por entre tormentas se elevam as emoções em mim.
Diminui-se cá dentro a razão em desencontros de lucidez.
Que só uma justiça vejo para os sentimentos.
Esta qualidade de me ser diáfana.
Não me pesam os desertos em que me fustigo.
Nem a aridez das derrotas de sentir demais.
São só poeiras.
Digo que me sujo nos lamaçais do desafecto.
Qual embaraço.
Se sinto não me amedronto.
Em manifesto me assumo e declaro que amo.
Se sinto não me escondo.
Não há disfarces para quem ama.
E o amor é o único escudo na vida.
O amor é um luxo ímpar.
Confesso, o amor é a minha vaidade.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Raquel...esta que sou!

Se eu não fosse eu, ninguém o seria por mim.
E a falta que eu faria!
Sendo outra Raquel ou qualquer uma, não seria esta.
E ainda que essa outra falta fizesse, não seria eu, seria ela.
Eu só me sei ser esta.
Só sou porque sou esta e mais nenhuma.
Coisa da natureza que me fez nascer.
Sorte minha, azar de tantos.
Rico previlégio o meu, tristeza de muitos.
Sou a Raquel…
Ah…!
Gosto de ser quem sou.
Agradeço-me por existir.
E gosto da falta que só eu faço ou poderei fazer!

...

Se eu não fosse eu, ninguém o seria!
E a falta que eu faria...

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Mentira

Salto, rio e finjo que não sinto.
Louvo, brindo e bebo.
Poucos sabem que minto.
Pois não aparento nenhum medo.


Mas é macabro este cansaço.
Suspender a vida é um pecado.
Doença de quem espera o abraço.
No sufoco de um coração fechado.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Do amor...sei nada!

Do amor… sei pouco.
Mas não me interessam as teorias rotas de quem talvez nunca o sentiu.
Nem os mapas do seu resgate e as moedas de troca que me apresentam.
O único suborno que permito ao amor é ele próprio.
Contento-me em senti-lo em todos os momentos.
E juro que não percebo esses predadores, esses fracos.
Lançam redes e embusccadas... esses imbecis pestilentos!
O amor não se apanha assim, aliás nem assim nem de forma nenhuma.
O amor não se caça, não se encontra, não se vende nem se compra.
O amor vive-se e só se dá para quem ama, para quem sente e vive.
E parece-me que a única forma de viver é sentir somente.
É essa a fórmula que nos protege, nos conserva e nos aproxima.
Sei pouco ou quase nada do amor…
Sei que não deixa dúvidas nem se confunde.
Só quem não ama vê desordem nos sentimentos.
É isso que faz sofrer, é isso que dói em quem ama e não é amado.
E é por isso que, tantas vezes, um coração que sente é um coração que sofre.
Não sei muito do amor, sei bem mais da sua falta.
Sei que quando não existe, se encena, se falsifica e adultera, cedo se abate.
Porque não há simulações que sobrevivam para sempre.
O para sempre é muito exigente e só com amor se consegue.
Porque o amor é uma força única que cresce dentro de nós.
Porque o amor abraça as diferenças e percorre as distâncias.
O amor não se aprende, não se resume nem define.
Do amor não sei grande coisa…
Do amor sei que… amor é amor – isso basta!

sábado, 4 de junho de 2011

Arrepio

Ouço aquela música.
Arrepio-me porque não estás.
Esqueço-me do espaço onde me encontro.
Arrepio-me mais ainda quando te vejo chegar.
A pele eriça-se e os batimentos sentem-se por cima da roupa.
Dizem que aparecem borboletas, mas não acredito.
Até porque as prefiro a voar e não presas numa parte fechada de mim.
Prefiro acreditar numa luta entre a lucidez e a fantasia.
Um arrepio cresce e demora-se.
Gosto.
Não me causa nenhum rubor, não é da minha natureza.
Nem deixo espaço para pejo ou castidade.
Assumo todos os meus arrepios com vaidade.
São excepcionais, valiosos e não poderia castrá-los.
Mas se me falas, sorrio e não digo nada.
Silencio-me nos teus olhos onde vejo brilhar os meus.
Suponho que me ouves mesmo sem falar.
Cala-se o arrepio, finda o duelo interno.
A ilusão ganha-me.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Perdes-te...

Perdes-te na dúvida como quem se mata na curva.
E olha que a vida pode ser bem dura para quem se perde.
Pára com essas análises desgastantes e redutoras.
Já cansas a própria dúvida.
Não percas tempo nas perguntas.
Que há respostas que só o tempo e a idade podem trazer.
Não te afastes do que queres para saber o que não queres.
E se te fores, não venhas com palavras acetinadas.
Isso é pegajoso, é triste, é penoso.
Perdes-te um minuto e lá se vão horas e dias desejados.
Vão-se as eternidades prometidas, estilhaçadas no chão.
Não te busques na solidão.
O abandono é intriga para o coração.
Desapega-te do medo, esse mau amigo.
Há quem se assuste com muito amor.
Mas a falta dele é um terror maior.
Não te percas mais com pérfidas suspeitas.
Perdes-te mais, demoras-te mais.
E descobres a perpetuidade escondida num segundo.
Perdes-te…
E ainda acabam abatidos na curva.

Privilégio de te amar

Que privilégio é este de te amar.
Não há distinção maior do que me ver no teu olhar.
Ah, e aquele toque que me arrepia a alma.
É verdade que, para mim, o nosso amor é uma honra.
O que importa que não sejas perfeito se te amo?!
O amor não é magistral,o amor é tão só amor.
E é tanto… e é meu e teu, é nosso!
Tens a mágica de ver o mar no verde dos meus olhos.
E eu vejo o céu na tua boca e música nas tuas mãos.
Tens o dom de me amar.
E quem disse que amar-me é fácil?!
O amor possibilita o impossível, o impensável.
E eu desejei impossivelmente o impensável.
Desejei este fascínio de corpos favorecidos pelo encaixe das almas.
Ah, como te amo!
O amor é um perfeito e requintado caminho que me conduz a ti.
E àquele nós que poucos sabem.
Poucos saberão como se beija um coração.
Porque isso é mistério dos verdadeiramente amantes.
Amantes como nós.
Ah, como beijas o meu sentimento!
Que privilégio é este de sentir dois corações que batem em uníssono.
Juntos numa perfeita comunhão.
Juntos prometem ao mundo que cuidarão um do outro.
Não há maior privilégio do que poder cuidar de ti muito para lá da vida.
E saber que o fazes também na mesma sem-medida!
O amor basta as desavenças e o nosso é bastante!
O nosso amor é um regaço que nos acolhe, é um afágo valioso.
Ah, como somos ricos e abençoados.
A natureza concede privilégios somente a quem ousa amar.
E nós desafiamos a vida e desfiamos os sentimentos um a um.
Quero que todos saibam que o amor não são desfiles, é apenas um corajoso e emocionado grito.
Que todos oiçam que te amo.
Eu ouvirei sempre o teu grito porque me é puro.
Amamo-nos como ama o amor…
Ah…! E isso é um honrado e inexplicável privilégio!

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Vamos falar...

Vamos falar de paixão.
Dizes-me arrebatamento.
Só?
É só isso?
Desconheço.
Não vi a essência.
Desejo mais…
Onde se compra?
Dizes-me que não se vende.
Digo-te que se encena.
Garanto-te…
Há boas composições teatrais,
E fantoches bem para lá do superlativo de bom.
Compro-te o ingresso?
Ah, já tens…
Agora calo-me sem espanto!

Sei lá,não sei...

Se me sinto sozinha no meio de uma multidão.
Se me sinto sozinha não estando fisicamente abandonada.
Se me sinto sozinha quando tenho verdadeiros amigos.
Se me sinto abandonada no lugar em que me obrigo a estar.
Se me sinto abandonada quando renuncio a sentimentos de reunião.
Se me retiro mesmo sabendo que há amor para receber.
Se me afundo no meio de pressentimentos absurdos e pesados.
Só posso ser uma exagerada patética.
Só posso ser uma comovente exaltada.
Não busco piedades, aflições ou qualquer tipo de complacência.
Mereço estar só.
Quero o silêncio, a paz, o desterro.
Quero estar só.
Se me sinto só não estando.
Se me sinto não ser ao ser quem sou.
Sou eu… o meu único desprezo.
Perdida nas minhas multidões sentimentais.
Retiro-me e percebo que não preciso de ninguém para estar sozinha.
Percebo que afinal me julguei acompanhada, quando não podia estar mais desalinhada.
Deve ser febre ou uma alucinação do espírito.
Passei para a outra margem, talvez.
Sento-me com uma solidão pacificadora e espero…
Espero que passe a confusão e toda esta exaltação ridícula.
Sinto-me insignificantemente mesquinha.
Passo por mim e não me vejo.
Serena, espero o meu regresso.
Assim, lentamente vejo-me de novo…
E preparo-me para sentir tudo de novo.