quarta-feira, 30 de março de 2022

Aos 36 (o texto de sempre com atraso)

Aos 36 (o texto de sempre com atraso)
Senti-me só (nunca estive mas vai-se lá entender a nossa cabeça), cansada, muito cansada, frustrada, insegura e perdida.
Perdi-me de mim e fiquei sem saber o que quero e o que procuro.
Resgatei a minha confiança lá no fundo, não o fiz sozinha e percebi que precisar dos outros para nos resgatarem é dramático mas encontrei colo nos colos de sempre e em pessoas inesperadas.
Percebi, como percebo sempre, que tenho os pais mais maravilhosos do mundo, a família mais incrível e os amigos, ah, os melhores de todos!- A vida não chegará para o amor que lhes tenho.
Fui embora mas voltei.
Dei passos atrás e recomecei, às vezes temos que partir de um lugar mais atrás do último em que estivemos.
Chorei, chorei muitas vezes e em nenhuma vez foi de alegria.
Dormi pouco e tive dias em que não dormi.
Dei abraços... muitos... e beijos sem fim.
Aprendi com a minha filha o que nunca esperei.
Entendi que tenho um longo caminho a percorrer em tanta coisa.
Não escrevi nem li e isso entristece-me.
Tive sede de cultura e de infinito.
Dei mergulhos no mar e soube-me a magret de pato com puré de baunilha.
Tive medo da morte, tenho sempre.
Fui mais vezes à farmácia do que ao restaurante.
Precisei de tempo, dei tempo e dei-me tempo.
Embebedei-me várias vezes - sem intenção.
Fiz mudanças e cortei o cabelo - dizem que uma mulher que corta o cabelo está prestes a mudar de vida.
Senti na pele e no espírito que há pessoas que vivem de intrigas e falsidade mas que o melhor a fazer é erguer o queixo e passar por cima em silêncio que ficar calado é também sabedoria e a indiferença é uma arma fatal para egos grandes.
Revoltei-me, várias vezes por vários motivos - acho que me vou revoltar sempre com muitas coisas.
Disse não e entendi, finalmente, que calar nem sempre é a solução.
Conheci pessoas novas, interessantes e encantei-me.
Falei com estranhos tantas vezes e sorri-lhes mais com os olhos (malditas máscaras).
Fiz escolhas definitivas, irreversíveis e conscientes.
Dormi agarrada à minha filha muitas vezes e não há dinheiro que pague isso.
Percebi que foi a Carlota quem me deu a vida e não o contrário - enchi a miúda de beijos e palavras de amor e acho que ela está farta de mim.
Desejei várias vezes o impossível e sonhei acordada ao som de Cohen.
Tive saudades, daquelas que nos rasgam em mil, do meu querido Pedro, do meu querido Tio César, das pessoas que já não tenho, de lugares, de momentos, de pessoas e de situações.
Tive saudades de quando tinha toda a família completa.
Tive saudades de dançar no Tendinha de copo na mão como se o mundo fosse aquela pista.
Deixei de fazer fretes e de sorrir para quem não interessa – não há pachorra!
Perdi o foco para a seguir me concentrar ainda mais no que interessa.
Aprendi que não há estradas diferentes, nem influências que afastem quem se quer encontrar e que por vezes, o melhor é seguir o coração por muito bons que sejam os conselhos que nos dão.
Disse, várias vezes, amo-te a todos que o deviam ouvir, declaradamente e subtilmente.
Tive vontade de engolir a minha filha e senti-me a mãe mais orgulhosa desta vida – acho que nasci para ser mãe desta bolota e amo ouvir "eu quero a minha mãe!" e "amo-te pelo meu coração acima, abaixo e por todo o lado!".
Olhei nos olhos e peguei nas mãos.
Percebi que dormir em conchinha faz bem às insónias - chamem-me pirosa!
Acreditei em energias - acho eu!
Redescobri encantos novos nos lugares do costume e nas pessoas que amo.
Desejei estar em casa, corri para casa.
Entendi que todas as relações são frágeis e que é fácil deixarmo-nos ir pelo caminho da impaciência.
Fiz coisas novas e imprevistas, umas mais radicais do que outras.
Lutei pela verdade e bati-me por ela a qualquer custo.
Não soube dizer a minha idade várias vezes e acordei sem saber que dia era – a parte da idade só agravou a minha ideia de que envelheci muito apesar de me sentir uma miúda.
Não tive dúvidas que o amor não nos cura mas salva-nos, não nos completa mas aumenta a alma.
Fui feliz e infeliz, porque é preciso deixar escorrer em nós tudo o que faz parte da vida.
Mas amei com todas as forças e isso é impagável porque a vida é breve e o amor é a única coisa que lhe sobrevive e nos faz viver eternamente nos que deixámos.

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